A Coiab expressa seu mais enérgico repúdio às recentes declarações feitas pelo Eminente Ministro Gilmar Mendes que ofenderam não só os indígenas da TI Raposa Serra do Sol e da TI Yanomami, mas todas as comunidades indígenas do nosso país. O Ministro se baseia em casos isolados e pontuais que não revelam a complexidade que nos é única, sendo completamente inaceitáveis e contrárias aos princípios de respeito, inclusão e diversidade que devem ser promovidos e protegidos em nossa sociedade, ofendendo em última instância até mesmo nossa dignidade humana como preceitua a Carta Magna.
Os povos originários são base da plurietnicidade da sociedade brasileira e as declarações proferidas pelo Ministro Gilmar Mendes não apenas perpetuam estereótipos prejudiciais, mas também desestabilizam os esforços contínuos para a construção de um país inclusivo, pluralista e pacifico. Em nenhum momento se referiu a nós como povos indígenas, como reiteramos que é a forma correta, sempre falando em “índios”. Mendes defendeu monocultura nos territórios indígenas, defendeu o garimpo como alternativa de “oportunidade para jovens indígenas” o mesmo garimpo que destrói as florestas, contamina nossos alimentos e adoece nossas crianças.
Em um universo em que o voto do ministro Alexandre de Moraes cria um precedente gravíssimo ao abordar a tese do Marco Temporal com uma terceira via que favorece invasores, vivenciamos posicionamento absolutamente preconceituoso do ministro Gilmar Mendes. Durante o julgamento, o ministro adota um discurso completamente anti-indígena, baseado apenas em vivências pessoais, boatos e desconhecimento, e ainda evoca países que não são bons exemplos de tratamento com seus povos originários.
O ministro ainda citou a qualidade de vida dos povos indígenas da TI Raposa Serra do Sol, dizendo que após a retirada de arrozeiros, “os índios viviam no lixão”. Além de equivocada, preconceituosa e desrespeitosa, esta fala demonstra um profundo desconhecimento da realidade da conquista de um território demarcado. A demarcação dá segurança à comunidade, às famílias, ao uso da terra conforme a cultura, espiritualidade, relacionamento com a natureza.
Enquanto Mendes fala em garimpo como alternativa econômica, em nossos territórios, como Yanomami e Munduruku, já temos sofrido com todas as violências causadas por esses invasores. Violências sexuais contra meninas e mulheres, o mercúrio nas águas e peixes contaminando famílias inteiras, inclusive bebês ainda na barriga das mães que estão nascendo com perda de audição, déficit cognitivo, atraso no desenvolvimento e malformação congênita. Isso sem falar a absoluta destruição dos rios e das florestas.
O Brasil é terra indígena. A partir de 1500 vivenciamos a invasão e o extermínio de muitos povos indígenas. Portanto, a declaração equivocada sobre estarmos fraudando laudos para demarcar terras indígenas é uma falácia. Segundo o MAPBiomas, uma rede colaborativa, formada por ONGs, universidades e startups de tecnologia, produzimos mapeamento anual da cobertura e uso da terra e monitoramos a superfície de água e cicatrizes de fogo mensalmente com dados a partir de 1985, as terras indígenas apresentam apenas 1% de perda de vegetação nativa por meio do desmatamento. Em contrapartida, entre os anos de 1990 e 2020, áreas privadas registraram o desmatamento de 45 milhões de hectares, o que é quase o tamanho da Bahia.
O Ministro ainda usou o Canadá como referência de exploração mineral pelos povos indígenas, enquanto há uma comitiva de ativistas e advogados indígenas na ONU denunciando a cumplicidade do Canadá com empresas extrativistas que estão violando direitos humanos, direitos indígenas e direitos ambientais na Amazônia Brasileira.
A Coiab ainda manifesta toda solidariedade às lideranças indígenas da [highlight= rgb(255, 255, 255)]Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo (APOINME) e ao Cacique Babau Tupinambá. Nossos povos convivem com a violência física e violência moral, grupos contra as demarcações desta região promovem o racismo e difamação das lideranças que lutam pela demarcação de suas terras. Foram inúmeras vezes em que a liderança da aldeia Serra do Padeiro, Território Indígena (TI) Tupinambá de Olivença foi alvo de ameaças. A defesa do território nos torna alvo de injúrias e de violências diversas, porém não nos calaremos, permanecemos em luta pela demarcação dos nossos territórios.