A Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) manifesta repúdio à aprovação da realização de audiência pública para discutir a reversão da demarcação da Terra Indígena (TI) Raposa Serra do Sol, em Roraima. O requerimento, feito pelo deputado federal Evair de Melo (Progressistas-ES), foi aprovado na última quarta-feira (12) pela Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados e representa uma ameaça e um desrespeito a uma conquista histórica, resultado da luta de anos dos povos indígenas pelo direito à terra.
Com o requerimento, a Comissão de Agricultura quer promover a retomada da ocupação da terra indígena por produtores de arroz, que já foram expulsos do território no passado e deixaram um legado de destruição em diversas áreas, que ficaram totalmente destruídas pelas ações de fazendeiros e arrozeiros.
A TI Raposa Serra do Sol é uma das maiores terras indígenas demarcadas no Brasil, com 1,7 milhão de hectares, e abriga uma população de 27 mil indígenas dos povos Macuxi, Wapichana, Taurepang, Patamona e Ingarikó. O território foi demarcado e finalmente homologado em 2005. Vale lembrar que não é a primeira vez que há tentativas de reverter o processo de demarcação. Em 2009, por fim, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu pela confirmação da demarcação contínua da TI Raposa Serra do Sol, garantindo aos povos indígenas os direitos de posse permanente e usufruto exclusivo, e determinou a retirada dos não indígenas do território.
O ato jurídico perfeito é aquele já realizado, acabado segundo a lei vigente ao tempo (tempus regit actum) em que se efetuou, pois já satisfez todos os requisitos formais para gerar a plenitude dos seus efeitos, tornando-se portanto completo ou aperfeiçoado. Sua importância para o direito é a proteção dada à pessoa da imutabilidade da situação jurídica que de boa-fé foi realizada dentro dos parâmetros legais quando sobrevém nova lei.
Conforme o artigo 5º da Constituição Federal, “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXXVI – a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”. Não cabe à Comissão de Agricultura, por meio de nenhuma ferramenta, questionar uma decisão que já transitou em julgado.
Qualquer tentativa de reversão do processo de demarcação de TIs homologadas representa uma afronta aos direitos duramente conquistados pelos povos originários dessas terras. A Coiab reafirma seu posicionamento contra toda e qualquer tentativa de retirada dos direitos dos povos indígenas da Amazônia.