Lideranças indígenas da Amazônia se reúnem para debater impactos do garimpo e alternativas econômicas para o bem viver nos territórios

Discussão no Acampamento Terra Livre é a segunda parte de um conjunto de ações específicas sobre o tema. No sábado (22) aconteceu um seminário em Brasília - DF.

Publicada em: 25/04/2023 às 01:00

Nesta terça-feira, 25, iniciou programação da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) no Acampamento Terra Livre (ATL). A primeira mesa da Tenda da Coiab teve o tema “Amazônia Indígena: Impactos do garimpo e alternativas econômicas”, com o apoio do WWF-Brasil e The Nature Conservancy.

O debate é a segunda ação relacionada ao garimpo nesta parceria, a primeira foi um seminário que aconteceu no dia 22, em Brasília, com o mesmo tema. A programação do seminário foi direcionada para discutir o garimpo – impactos, relatos, dados sobre contaminação mercurial, cadeia do ouro, e também, alternativas econômicas a esta prática que é ilegal.

No painel, que foi mediado pela presidente do Conselho Deliberativo da Coiab, Auricélia Arapium, foi apresentado o resultado do seminário e aberto para relatos e discussões de lideranças de toda a Amazônia que enfrenta o garimpo. O cacique Arnaldo Munduruku, quando pediu a fala, relembrou a época que a malária assolava as comunidades, e ressaltou que o lidar com contaminação por mercúrio está sendo muito pior. “Antigamente, sofríamos com a malária. Agora não tem mais malária, agora sofremos com o mercúrio”, afirmou.

O Seminário

O coordenador-geral da Coiab, Toya Manchineri, pontuou na fala inicial os objetivos do seminário. “É muito triste estarmos falando sobre isso, pois temos muitas mulheres, crianças, anciãos, contaminados pelo garimpo, e essas pessoas não tem nada a ver com essa destruição motivada pela ganância. Esse evento traz os resultados do garimpo nos territórios, que são todos negativos, e contrapõe esse discurso de que o garimpo é necessário para viver no território, pois apresentamos alternativas de economia nas Terras Indígenas”, ressaltou o coordenador.

Liderança de Roraima, Mauricio Yekwana, conduziu o diagnóstico sobre o garimpo e impactos socioambientais. A gerente de Monitoramento Territorial Indígena da Coiab, Vanessa Apurinã, apresentou as ferramentas de monitoramento e vigilância territorial para o combate ao garimpo ilegal. Sobre a cadeia do ouro e os impactos na saúde humana, os palestrantes foram Deborah Goldemberg, do WWF-Brasil, e Paulo Basta, da Fiocruz. O jurídico da Coiab pontuou sobre mineração e lavra garimpeira na perspectiva da Constituição Federal de 1988.

O garimpo acentua os desequilíbrios de gênero nos territórios, e no seminário houve um momento para as mulheres falarem desses impactos específicos relacionados ao gênero. A mesa teve a presença de Dineva Kayabi, Erika Yanomami, Tania Paiakan Kaiapó, Auricélia Arapium, Vanessa Apurinã e Beka Saw. A vice-coordenadora tesoureira, Dineva Kayabi ressaltou como outros empreendimentos podem acelerar a invasão nos territórios.

A jovem comunicadora do povo Munduruku, Beka Saw, relatou os impactos do garimpo no território. “Tem comunidade completamente vulnerável aos garimpeiros, pois agora os animais e os peixes estão cada vez mais difíceis. As máquinas trabalham dia e noite, afastando as caças, os peixes já estão todos doentes, as pessoas precisam pescar e comer mesmo assim, e o peixe tem gosto de óleo. Os garimpeiros tem as máquinas que afastam o alimento tradicional, e eles mesmos levam alimentos para as comunidades, deixando as aldeias reféns dessa exploração. Muitos chamam as meninas para trabalhar no garimpo, e quando elas chegam lá, é para prostituição. Nessa situação, a família inteira sofre”, apontou Beka.

Ao fim da programação, a mesa apresentou e discutiu alternativas econômicas ao garimpo, formas de oferecer aos povos indígenas e outros povos da floresta a geração de renda de forma sustentável. A coordenadora secretária Marciely Ayap Tupari apresentou duas iniciativas de Rondônia, uma do povo Paiter Suruí, e outra das mulheres indígenas artesãs de Rondônia.

O coordenador da rede de jovens comunicadores da Coiab, Mitã Xipaya, apresentou a rede de cantinas da Terra do Meio, uma forma de articular povos indígenas, extrativistas, seringueiros e outros povos e comunidades tradicionais para fornecerem produtos naturais para empresas, de forma coletiva. O coordenador-geral, Toya Manchineri, expôs experiências de lugares distintos da Amazônia, como o Festival Yawanawá, o manejo de pirarucu dos Kokama e os planos de vida já elaborados por comunidades, como o do Oiapoque.

A Programação

Ao longo do dia, toda a programação foi dedicada a tratar de temas específicos sobre a Amazônia, território, proteção e monitoramento. A mesa em parceria com a Amazon Watch deu destaque para a demarcação das terras indígenas como ferramenta de monitoramento e proteção territorial.
À tarde, as mudanças climáticas foram o tema principal com a presença de Sineia do Vale, que conduziu a apresentação do Vozes pela Ação Climática Justa. A Campanha Amazônia de Pé, que a Coiab é signatária, foi apresentada no fim do dia.

A atração da noite na Tenda da COIAB foi a exibição do filme “Amazônia: a nova Minamata?”, com a presença do diretor, Jorge Bodanzky, e da jovem comunicadora da Coiab, Beka Munduruku, que integra o Coletivo Daje Kapap Eypi, que co-produziu o filme.