Roraima: lei que legaliza garimpo vai aumentar violências contra os povos originários da Amazônia

Nota de Repúdio da COIAB sobre a Lei 1.453/2021

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Publicada em: 06/02/2021 às 02:00

A Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) vem a público repudiar com veemência a recém sancionada Lei 1.453, publicada no dia 8 de fevereiro no Diário Oficial do Estado de Roraima[/url].

Esta lei, claramente inconstitucional, dispõe sobre o Licenciamento para a Atividade de Lavra Garimpeira naquele Estado, e dá outras providências, ou seja, legaliza a atividade garimpeira e o uso do mercúrio, colocando em grave risco rios, florestas, lagos, igarapés e diversos outros recursos naturais que utilizamos em nossos territórios.
Mais uma vez a Amazônia está sendo entregue àqueles que querem explorá-la de maneira predatória sem considerar a vida das populações indígenas e tradicionais, a biodiversidade, os efeitos das mudanças climáticas e um debate justo e transparente sobre o Meio Ambiente brasileiro.

O garimpo é um dos grandes agentes poluidores dos rios amazônicos e contribui com a destruição da biodiversidade local, além de piorar a qualidade de vida em nossos territórios. Há décadas os povos indígenas vêm denunciando as atividades garimpeiras ilegais nos territórios indígenas.

Consideramos que a Lei 1.453 é inconstitucional porque ela afronta diretamente vários artigos da nossa Carta Magna. Ela vai contra, por exemplo, o artigo 23, que trata da competência comum dos entes federados para a proteção do Meio Ambiente. Da mesma maneira, ela desrespeita o artigo 24, que afirma ser da competência da União o estabelecimento das normas gerais de proteção e responsabilidade por danos ao Meio Ambiente. Adicionalmente, ela se coloca de maneira oposta ao artigo 225, que prevê o “direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e dever estatal de promover a sua defesa e proteção para as presentes e futuras gerações”.

É inconstitucional também porque a lei aprovada não exige estudo prévio, autoriza o uso de mercúrio, prevê exploração de áreas de até 200 hectares e permite o uso de maquinaria pesada na atividade. Esses fatores somados compõem um cenário de tragédia anunciada, que vai causar o aumento da violência contra os povos originários da Amazônia, das invasões de áreas protegidas, Terras Indígenas e da degradação de recursos naturais.

Além disso, a tramitação da Lei 1.453 foi feita de forma apressada e sem a devida discussão pública sobre o assunto – o projeto de lei foi apresentado à Assembleia Legislativa de Roraima no dia 22 de dezembro, menos de dois meses atrás. Ademais, como bem lembrou o Ministério Público Federal (MPF), que investiga a legalidade da aprovação da Lei 1.453/2021, é de competência exclusiva da União legislar sobre a exploração de minérios.

Este projeto faz parte de um amplo pacote de ataques que vêm sendo perpetrados por agentes públicos nos últimos anos contra os recursos naturais brasileiros e não é, de maneira alguma, um caso isolado. Basta lembrarmos do Projeto de Lei 191/2020, que tramita na Câmara dos Deputados, em Brasília (DF), que prevê a legalização do garimpo e mineração em Terras Indígenas. Em outros estados amazônicos, existem projetos deste mesmo teor.

Consideramos ainda que aprovar um projeto desta natureza em plena pandemia da Covid-19 é aprofundar um cenário de calamidade pública e violências, em que, nós, povos indígenas amazônicos, estamos mais vulneráveis nas nossas terras. Estimativas dão conta de que existem hoje mais de 20 mil garimpeiros trabalhando ilegalmente na Terra Indígena Yanomami, em Roraima – e este povo tem sido um dos mais atingidos pelos efeitos do coronavírus. E são mais de 2 mil garimpeiros na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, sendo que a aprovação da Lei estimula a invasão e coloca em risco a vida dos povos indígenas.

Por tudo isso, a COIAB exige que a Lei 1.453 seja IMEDIATAMENTE ANULADA para impedir mais essa ameaça às vidas dos povos indígenas, das populações tradicionais, do patrimônio natural do nosso país – sob o risco de prejuízos irreparáveis aos recursos naturais e vidas de toda a Amazônia.

Manaus – AM, 10 de fevereiro de 2021
Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB)