A Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB) repudia os esforços que a Funai tem concentrado para intimidar, perseguir e criminalizar lideranças indígenas que buscam seus direitos ao se manifestarem contra essa política genocida do governo federal instaurada contra os povos indígenas do Brasil. Recentemente, Sonia Guajajara e Almir Suruí tiveram inquéritos arquivados por falta de argumentos. Mais uma vez, o Presidente da Funai pede para abrir um inquérito policial contra uma liderança indígena. Desta vez o alvo da agressão foi Mario Parwe Atroari, do povo indígena de recente contato Waimiri Atroari, que ocupa o território entre os estados do Amazonas e Roraima. Além dele, mais nove servidores da Funai e dois advogados de duas organizações indígenas foram indiciados.
A acusação é que o grupo estaria causando entraves e óbices ao desenvolvimento do país, dificultando a implantação do “Linhão de Tucuruí”, interligação do sistema de transmissão de energia elétrica entre Manaus e Boa Vista. Desde a campanha eleitoral, os indígenas vêm lutando contra os discursos de ódio do Presidente Jair Bolsonaro, que usa as suas redes sociais para falar que as obras do Linhão (promessa de sua campanha) já estariam garantidas e com o processo de licenciamento praticamente concluído, se não fossem as pendências junto aos indígenas Waimiri Atroari, colocando, como sempre, a população não indígena contra nós, povos indígenas. No pedido de abertura do inquérito à polícia federal, o delegado e Presidente da Funai, Marcelo Xavier distorce os fatos do licenciamento quando, em pleno processo de consulta livre, prévia e informada, acusa as lideranças e organizações indígenas e o grupo de servidores de estarem obstruindo o processo.
O plano de compensação e mitigação dos impactos gerados pela obra, que deve atravessar o território Waimiri Atroari, estava em processo de tradução e consulta ao povo indígena, garantido pela convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A obra deve passar por mais de 120 km dentro da Terra Indígena, reduzindo a mobilidade dos indígenas em seu território, e os colocando em risco pela movimentação de máquinas e trabalhadores da obra, entre outros impactos da instalação e do pós-obra.
Neste contexto, os Waimiri Atroari vinham tratando com o governo brasileiro. Mas agora, “parece” que a atual gestão da Funai não tem paciência ou não entende as necessidades de esclarecimento aos indígenas. Mesmo com as tratativas com o povo Waimiri Atroari avançadas , o presidente da Funai apresenta essa denúncia, colocando em cheque toda negociação anterior e deixa muito claro que não está na Funai para defender os direitos dos povos indígenas.
Esperamos que essa nova ação do governo brasileiro não seja entendida pelos Waimiri Atroari como uma nova declaração de guerra, como a que seus guerreiros enfrentaram a partir da década de 1960, quando o território indígena começou a ser cortado com uma estrada, a BR-174. Na implementação dessa obra, os Waimiri Atroari perderam cerca de 85% de sua população. Os empreiteiros da época, por meio do próprio Exército e seu 6° Batalhão de Engenharia e Construção, usaram de força extrema contra os indígenas, deixando vivos pouco mais de 350 pessoas. Alguns Kinja (como se autodenominam os Waimiri Atroari) mais velhos ainda se lembram dos ataques de aviões despejando veneno, invasões e a morte de homens, mulheres e crianças de aldeias inteiras. Hoje, o povo Waimiri Atroari sobreviveu, e hoje é mais um exemplo de luta e resiliência dos povos indígenas. Com suas potentes estratégias, resistiram bravamente as tentativas de genocídio do seu povo.
Assim, reafirmamos mais uma vez que não permitiremos mais extermínios, ataques, ameaças e retrocessos! Os povos indígenas, e suas lideranças e organizações de representação, agora estão sendo criminalizados por defender os seus direitos e os seus territórios garantidos pela Constituição Federal! Não vamos recuar! Resistiremos, seguindo vigilantes em defesa das nossas vidas, terras e casas! Estamos juntos com o povo Waimiri Atroari, na luta e resistência!
Manaus, 7 de junho de 2021.
Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB)