A Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) oficializou o Mecanismo Amazônico dos Pueblos Indígenas (MAPI), uma instância inédita de participação direta dos povos indígenas na governança regional. Criado para fortalecer o diálogo político e a cooperação entre governos e representantes indígenas, o MAPI consolida um processo iniciado em 2023 e marca um avanço histórico na integração amazônica.
O mecanismo nasce ancorado no Tratado de Cooperação Amazônica e nas Declarações de Belém e Bogotá, que já haviam reconhecido a necessidade de ampliar a voz dos povos indígenas nas decisões sobre seus territórios, seus direitos e a proteção da floresta. Desde então, diversas reuniões ministeriais, entre elas a IV Cúpula de Presidentes da OTCA, em agosto de 2023, e os encontros de ministros de Relações Exteriores em novembro de 2023 e agosto de 2025, pavimentaram o caminho para a adoção das resoluções que deram vida ao MAPI.

foto: Guilherme Silva Pinheiro| OTCA
A criação do MAPI ocorre em um momento de intensificação das pressões sobre a Amazônia, marcado pelo avanço de projetos predatórios, como o aval inicial para a exploração de petróleo na Foz do Amazonas. Ao instituir um espaço permanente de diálogo, o mecanismo busca unificar respostas regionais, promover ações coordenadas entre países e garantir que políticas de desenvolvimento e de proteção ambiental incorporem, desde a origem, a perspectiva e as prioridades dos povos indígenas.Além disso, o Mecanismo fortalece a cooperação institucional ao apresentar informes e recomendações à Comissão do Conselho de Cooperação Amazônica (CCOOR) e ao se articular com redes, grupos de trabalho e iniciativas regionais para ampliar a defesa dos territórios e a participação indígena na governança pan-amazônica.
A intenção é que, a partir da primeira sessão oficial, prevista para dezembro deste ano, quando serão definidos a copresidência, a estratégia inicial e as mesas temáticas, o mecanismo se consolide como um espaço permanente de governança intercultural e incidência política na região.
Angela Kaxuyana, integrante da diretoria da Coiab e representante da Coordenação das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica (Coica), destaca a importância histórica do momento como fundamental na ampliação da participação indígena nas cooperações governamentais que tangem à Amazônia continental.
“Nós vemos o mecanismo como um espaço fundamental porque garante paridade na sua composição e assegura que a participação indígena não seja apenas simbólica, mas estruturante. Na última Cúpula, o Brasil foi eleito para a copresidência, que será exercida pela ministra Sônia Guajajara. Eu, representando a Coiab, não estarei apenas na condução desse processo, nosso papel será fortalecer a governança do mecanismo para garantir uma participação qualificada e efetiva dos povos indígenas amazônicos.”, explica.

Foto: Tainá Xavier| Mídia Ninja
Durante a reunião da Cúpula dos Presidentes da OTCA, em Bogotá, houve um avanço histórico na participação indígena com o lançamento do mecanismo e a definição de sua primeira co-presidência. A Coiab, ao lado do governo brasileiro por meio do Ministério dos Povos Indígenas, conduzirá o primeiro ano de trabalho. A representante da Coiab na Bacia Amazônica, Angela Kaxuyana, atuará como titular da co-presidência, e o coordenador-geral da Coiab, Toya Manchinery, assumirá a suplência.
Participação direta e governança compartilhada
O MAPI estabelece um modelo inovador de governança, baseado em copresidência rotativa: uma representação indígena e uma representação governamental dividirão a condução política do mecanismo. A Secretaria Técnica será exercida pela própria OTCA, encarregada de organizar reuniões, consolidar documentos e facilitar o diálogo entre os países membros.

Foto: Guilherme Silva Pinheiro| OTCA
Entre as atribuições do MAPI estão a elaboração de planos de trabalho conjuntos, a participação em comissões temáticas, a produção de recomendações à OTCA, a formulação de medidas de proteção frente a ameaças como desmatamento, mineração ilegal e contaminação, e o fortalecimento de capacidades em parceria com universidades amazônicas e centros de pesquisa. O mecanismo também terá papel estratégico na proteção dos Povos Indígenas em Isolamento e Contato Inicial (PIACI), por meio da criação de protocolos regionais de salvaguarda
Marco para a diplomacia indígena e a ação climática
Além de fortalecer a participação indígena, o MAPI se alinha às prioridades globais de enfrentar a crise climática e proteger a maior floresta tropical do planeta. Ao reconhecer o papel dos povos indígenas na preservação da Amazônia, os países amazônicos sinalizam que qualquer proposta de desenvolvimento sustentável passa necessariamente pela consulta e respeito aos territórios, aos modos de vida e ao conhecimento tradicional.
Com apoio técnico e financeiro de programas como Amazonía+, Euroclima, FILAC e OIT, o mecanismo chega para ocupar um espaço até então inexistente na arquitetura de cooperação regional: o de uma instância estruturada, contínua e dotada de legitimidade política para dialogar de forma direta com os governos da Pan-Amazônia.

Foto: Guilherme Silva Pinheiro| OTCA
O lançamento do MAPI representa, portanto, um passo decisivo para a construção de uma Amazônia com mais participação, mais proteção e mais justiça territorial, um compromisso que, pela primeira vez, ganha forma institucionalizada na OTCA com apoio das organizações indígenas de toda à bacia amazônica. A Coiab, por sua vez, constroi esse mecanismo como forma de ampliar à participação dos povos indígenas nas decisões estratégicas no que tange os territórios ancestrais da Amazônia Legal.
