A Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), por meio desta Carta, reafirma sua missão institucional de defesa dos direitos dos povos indígenas nos termos do seu Estatuto Social e está comprometida com a Educação Escolar Indígena como um direito fundamental e instrumento essencial para a preservação de nossas línguas, culturas, tradições e formas próprias de aprendizagem.
Direito esse já devidamente assentado e resguardado pela legislação nacional e internacional, fruto da própria luta indígena. A Constituição Federal de 1988 reconhece a diversidade étnico-cultural do Brasil e garante aos povos indígenas o direito à educação diferenciada, bilíngue e intercultural (arts. 210 e 231). A Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas (ONU, 2007) reforça esse direito ao reconhecer a necessidade de sistemas educacionais próprios e autodeterminados. O Plano Nacional de Educação também prevê diretrizes específicas para a valorização e fortalecimento da Educação Escolar Indígena. Além disso, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996) estabelece parâmetros para a educação indígena diferenciada, bilíngue e intercultural, garantindo o respeito às tradições e especificidades dos povos indígenas.
Esses dispositivos demonstram que a legislação que garante o direito à Educação Escolar Indígena é ampla e consolidada e qualquer medida que impacte direta ou indiretamente essa gama esbarra no direito à consulta livre, prévia e informada. A Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil por meio do Decreto nº 5.051/2004 e reafirmada pelo Decreto nº 10.088/2019, estabelece a necessidade de observância do referido direito sempre que medidas administrativas ou legislativas possam afetar diretamente nossos povos.
Nesse sentido, a Coiab defende que qualquer decisão, projeto ou política pública relacionada à Educação Escolar Indígena respeite e garanta nosso direito à consulta prévia, conforme determina a Convenção 169 da OIT e outros dispositivos legais nacionais e internacionais. É inadmissível que decisões sejam tomadas sem a devida participação da totalidade dos povos, violando nossos direitos e desconsiderando nossas necessidades e especificidades culturais.
Nos últimos anos, enfrentamos inúmeros desafios relacionados à implementação de políticas públicas, projetos e empreendimentos que afetaram nossos territórios e modos de vida diretamente, sem a devida observância do nosso direito de participação e decisão. Razão pela qual, diante do cenário estabelecido no estado do Pará, reafirmamos que toda e qualquer decisão que impacte direta ou indiretamente o direito à educação escolar indígena deve respeitar o direito à plena participação de todos os povos indígenas do estado por meio de seus instrumentos próprios.
O direito à consulta prévia e aos protocolos de consulta dos povos indígenas são mecanismos essenciais para a garantia da autodeterminação e da proteção dos direitos coletivos. Seu reconhecimento e implementação efetiva fortalecem a democracia participativa e promovem a justiça social para os povos indígenas no Brasil.
A revogação da Lei nº 7.806/2014 pela Lei nº 10.820, sem consulta prévia à totalidade dos povos indígenas do Pará, fere diretamente a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da qual o Brasil é signatário. Ao extinguir o Sistema de Organização Modular de Ensino Indígena (Somei), que garante o ensino presencial respeitando as especificidades culturais e linguísticas dos povos indígenas, sem um processo amplo de diálogo e participação dessas comunidades, o governo estadual desconsiderou um direito fundamental assegurado pela convenção, violando os princípios da autodeterminação e da participação ativa dos povos indígenas na formulação de políticas públicas que impactam suas vidas.
Os povos indígenas são os guardiões da floresta e desempenham um papel fundamental na preservação da biodiversidade e no combate às mudanças climáticas. Sem garantir seus direitos e respeitar seus protocolos de consulta, qualquer tentativa de realizar uma Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP) na Amazônia seria incoerente com os princípios de justiça climática e sustentabilidade.
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