A Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) acompanha com máxima preocupação a retomada da discussão da Tese do Marco Temporal para os territórios indígenas no Supremo Tribunal Federal (STF). O caso pode voltar ao plenário nos próximos meses, em um contexto estratégico e sensível para o país: às vésperas ou durante a COP30, que será realizada em Belém (PA).
Apesar de ainda não haver data definida para o julgamento, o presidente do Supremo, Edson Fachin, tem demonstrado interesse em incluir na pauta de julgamentos do plenário processos com grande impacto para o meio ambiente até o fim deste ano — entre eles, o que trata da legalidade da tese do Marco Temporal.
Em 2023, no julgamento do RE 1.017.365, o STF já havia reconhecido a inconstitucionalidade da tese do Marco Temporal por ampla maioria. A proposta tenta limitar o direito originário aos territórios apenas aos povos que estivessem fisicamente em sua terra em 5 de outubro de 1988 — ignorando séculos de invasões, expulsões, remoções forçadas, massacres e processos contínuos de retomada territorial.
A decisão histórica de 2023 representou uma afirmação da Constituição e dos direitos indígenas, reconhecendo a injustiça estrutural que recaiu sobre os povos originários ao longo da história.
Contudo, mesmo diante dessa decisão, a bancada ruralista articulou no Congresso Nacional uma lei para restabelecer o Marco Temporal, em confronto direto com a Constituição e com a decisão do STF. Cinco ações judiciais propostas por partidos políticos e pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) discutem novamente esse tema na Suprema Corte.
Agora, com mudanças na composição do STF, o novo julgamento se torna incerto e exige mobilização permanente de toda a sociedade. Além do Marco Temporal, Fachin também pautou processos que afetam diretamente os povos indígenas da Amazônia, como o caso da Ferrogrão, que ameaça territórios tradicionais e áreas protegidas no Pará e em Mato Grosso, ampliando riscos ambientais e pressões sobre comunidades.
Direito à terra: pilar da resposta climática
A Coiab reforça que os povos indígenas são protagonistas na proteção do meio ambiente e fundamentais no enfrentamento às mudanças climáticas — tema central da COP30. Garantir a demarcação e proteção das Terras Indígenas é condição indispensável para que o Brasil cumpra suas metas ambientais e preserve sua sociobiodiversidade.
Essa visão está expressa nas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) Indígenas — documento construído por autoridades e lideranças dos nove países da Bacia Amazônica, que reivindica:
- Reconhecimento e proteção de todos os territórios indígenas, especialmente os com presença de povos isolados e de recente contato
- Financiamento direto e autonomia financeira para povos indígenas
- Participação efetiva nos espaços de decisão climática
- Proteção de defensores e defensoras indígenas
- Inclusão dos sistemas de conhecimento tradicional como estratégias de mitigação, adaptação e restauração ambiental
- Estabelecimento dos territórios indígenas da Amazônia como áreas livres de atividades extrativas
A resposta somos nós
Essas agendas convergem com a campanha “A Resposta Somos Nós”, que convoca a sociedade global para uma transformação urgente em defesa do clima e da vida.
Os povos da floresta, das águas, do campo e das cidades afirmam: “Não haverá futuro possível sem justiça territorial.”
No ano da COP30 na Amazônia, a Coiab reforça que é hora de ouvir as vozes dos povos indígenas, que há milhares de anos têm a resposta para preservar a vida no planeta. O Brasil deve honrar sua responsabilidade nacional e global garantindo os direitos constitucionais que já existem — começando pela proteção das Terras Indígenas.
Sem território, não há clima. Sem justiça territorial, não há futuro.
