Às vésperas da COP30, povos indígenas da Amazônia lançam proposta climática inédita e denunciam retrocessos ambientais no Brasil

“Estamos no limite do ponto de não retorno”, declaram lideranças indígenas

Por: Valdeniza Vasques

Publicada em: 01/06/2025 às 16:31

De 2 a 5 de junho, lideranças indígenas de nove países da Bacia Amazônica estarão reunidas em Brasília para a Pré-COP Indígena, encontro estratégico que marcará o lançamento da primeira NDC indígena – uma proposta inédita de contribuição climática construída a partir das visões, experiências e soluções dos povos indígenas.

A iniciativa é liderada pela Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e conta com o apoio da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e da coalizão internacional G9 da Amazônia Indígena. O documento será apresentado na Conferência de Clima de Bonn, em junho, e na COP30, que acontecerá em novembro, em Belém (PA).

Mais do que um evento preparatório, a Pré-COP Indígena representa uma inflexão política na luta global contra a crise climática. As lideranças indígenas irão consolidar uma agenda comum com propostas de mitigação, adaptação e acesso direto a financiamento climático, reforçando o papel central dos territórios indígenas como soluções efetivas para o enfrentamento da emergência climática.

“Estamos diante do colapso climático e da destruição dos nossos territórios. A NDC Indígena é uma resposta coletiva ao sistema que insiste em ignorar quem protege a floresta há milênios. A Amazônia está no limite do ponto de não retorno”, afirma o coordenador geral da COIAB, Toya Manchineri.

O chamado indígena acontece em um contexto de intensos ataques à floresta e aos povos que nela vivem – como a mineração em terras indígenas, exploração de petróleo e gás e suspensão de processos de demarcação já em andamento. Recentemente, o Senado brasileiro aprovou o ‘PL da Devastação’ (2.159/2021), que flexibiliza o licenciamento ambiental no país e retira a proteção aos territórios indígenas ainda em processo de demarcação, favorecendo, na prática, o avanço de atividades como mineração e agronegócio.

“O PL da Devastação é apenas o mais recente de uma série de ataques. Seguimos resistindo com firmeza ao Marco Temporal. Enfrentamos um Congresso determinado a abrir nossas terras à exploração desenfreada. O mundo precisa compreender, de uma vez por todas: proteger os povos indígenas e seus territórios é proteger o equilíbrio climático do planeta. A demarcação das terras indígenas deve ser reconhecida como uma política climática estratégica – com metas claras e financiamento direto. Liderança climática se constrói com ações reais, não com promessas vazias. O tempo da espera acabou”, reforça Manchineri.

Para Patricia Suarez, da Organização Nacional dos Povos Indígenas da Amazônia Colombiana (OPIAC), o momento é decisivo: “A pré-COP indígena amazônica é um marco histórico. Não estamos aqui apenas para sermos ouvidos – exigimos ser reconhecidos como protagonistas na construção de soluções climáticas efetivas. Nossos territórios, nossos conhecimentos e nossas formas próprias de governança não são complementares: são fundamentais para enfrentar a crise climática global. Diante da ameaça real da Amazônia se aproximar perigosamente de um ponto de não retorno, é inaceitável que nossas vozes sigam sendo tratadas como periféricas. Os povos indígenas são guardiões da maior floresta tropical do planeta – ignorar nosso papel é comprometer o futuro da humanidade. Exigimos que nossas delegações ocupem posições de liderança nos espaços de negociação e decisão na COP30. Queremos diálogo direto com governos e organismos multilaterais. Não há justiça climática sem protagonismo indígena.”

Foto de capa: Kaiti Gavião