Nawa e Kapanawa se reencontram após 103 anos de distanciamento com a participação da Coiab, Rainforest Foundation e Funai

Por: Funai

Publicada em: 24/09/2025 às 10:43

Na fronteira entre Brasil e Peru, dois povos da mesma origem estão divididos pela língua e por uma Serra dentro da floresta amazônica. São os Nawa do Brasil e os Kapanawa do Peru, que viveram um reencontro histórico após 103 anos de distanciamento desde a última vez que a relação foi citada em documentos. A ação foi realizada na última sexta (18), na comunidade de Limoncocha, às margens do rio Tapiche, na província de Requena, Departamento de Loreto, no Nordeste do Peru. O encontro aconteceu com os apoios da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab) e da Rainforest Foundation Noruega (RFN), além da participação da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai)

O momento, segundo as lideranças indígenas Nawa, foi a oportunidade para reavivar laços, fortalecer a cultura e incentivar a língua dos dois povos da mesma origem que vivem na fronteira dos dois países. A atividade aconteceu com a participação do cacique Railson Nawa; da professora e liderança indígena, Lucila Nawa; do agente de monitoramento territorial indígena, Virlandio Nawa; e do jovem indígena, Ykaruni Nawa. O reencontro foi conduzido pelo professor Humberto Sachivo, do povo Kapanawa.

Diálogo entre caciques do Brasil e Peru

Fio da história

As lideranças Nawa destacaram que o livro “O Juruá Federal: o território do Acre”, publicado por José Moreira Brandão Castello Branco Sobrinho, em 1922, é a principal obra que confirma a relação entre a origem dos povos após ao descrever um diálogo entre a indígena Mariruni, considerada a última ancestral do povo Nawa/Kapanawa no Brasil. Anos depois, em 1943, Curt Nimuendajú, importante etnólogo germano-brasileiro, reforça o pertencimento dos dois povos dentro do “Mapa etnolinguístico do Brasil e regiões adjacentes”.

De acordo com a Coordenadora Tesoureira da Coiab, Dineva Kayabi, do povo Kawaiwete, a colonização deixou marcas no passado que os povos estão corrigindo hoje. “A colonização nos afetou enquanto povos, mas não alcançou êxito total e esse reencontro é uma prova de que ainda é possível reverter os malefícios que afetaram nossas línguas indígenas. O intercâmbio vem para fortalecer a cultura que está adormecida entre os povos Nawa e Kapanawa”, disse a coordenadora.

A liderança Lucila Nawa, que é bisneta de Mariruni e guardiã da língua indígena no Brasil, apontou a relevância do reencontro. “Fomos reavivar nossas origens. Os nossos parentes Kapanawa compartilham muito da mesma língua, porém no Peru eles são fluentes e no Brasil, nós não somos mais – temos apenas palavras. Queremos reavivar o pouco da língua que conseguimos guardar”, disse a professora Lucila.

O cacique do povo Nawa aproveitou a oportunidade para conversar com o cacique da comunidade Limoncocha. O objetivo foi planejar um novo encontro brevemente. Dessa vez, as lideranças querem vir por dentro da floresta. “Foi muito esforço chegar até aqui. São 5 dias seguidos de viagem saindo da minha aldeia. Se ajustarmos as coordenadas geográficas, conseguimos chegar aqui na comunidade Limoncocha por dentro da mata. Nosso território não está distante”, destacou Railson.

Despedida da comunidade Limoncocha

A missão

Para chegar na comunidade Kapanawa, os Nawa saíram do extremo Noroeste do Acre e passaram por Brasília, no Brasil; Lima, Iquitos e Requena, no Peru; além das localidades de Santa Elena e Fátima, no alto rio Tapiche, também no Peru. No total, foram 5 dias de viagem ininterruptos, com paradas apenas para dormir.

A atividade compõe as iniciativas indígenas de fortalecimento do “Protagonismo Indígena na Governança e Gestão Territorial dos Corredores de Povos Isolados na Fronteira Brasil-Peru”, que é uma parceria entre COIAB e Bezo’s Earth Fund para fortalecimento de espaços de governança e plataforma política dos povos indígenas transfronteiriços.

O reencontro resultou na assinatura de um documento coletivo sobre a identidade Nawa e Kapanawa. As lideranças indígenas apontam na “Carta de Limoncocha” a necessidade do intercâmbio constante, do fortalecimento cultural e linguístico e de trocas de informações sobre os dois territórios na região de fronteira entre Brasil e Peru.

A atividade foi acompanhada ainda pela assessora política da RFN-Peru, Beatriz Huertas, do gerente de Povos Indígenas Isolados e Recente Contato (GPIIRC/COIAB), Luiz Fernandes, e dos técnicos Ruan Guajajara, da Gerência de Monitoramento Territorial Indigena da COIAB (GEMTI/COIAB) e Paulo Baniwa da GPIIRC/COIAB.

Fotos: Ykaruni Nawa